segunda-feira, julho 28, 2014

Em carta aberta, candidato à deputado federal pelo PT do Paraná acusa Dilma de provocar R$ 53 bilhões de prejuízos ao setor elétrico

Em carta aberta á presidente Dilma Rousseff, o candidato à deputado federal pelo PT do Paraná, o empresário Ivo Pugnaloni, diz que o excesso de burocracia trava hoje a construção de 9,2 mil MW de projetos de pequenas hidrelétricas de baixo impacto ambiental. "Isso provocou R$ 53 bilhões de prejuízos. O que a presidente da República pode fazer para corrigir a situação?", cobra Pugnaloni. Leia a seguir a carta na íntegra,


Carta aberta das PCHs à Presidente Dilma Rousseff.

EXCESSO DE BUROCRACIA TRAVA HOJE A CONSTRUÇÃO DE 9.200MW DE PROJETOS DE PEQUENAS HIDRELÉTRICAS DE BAIXO IMPACTO AMBIENTAL. ISSO PROVOCOU 53 BILHÕES DE PREJUÍZOS. O QUE A PRESIDENTE DA REPÚBLICA PODE FAZER PARA CORRIGIR A SITUAÇÃO?

Ivo Pugnaloni

SENHORA PRESIDENTE DA REPÚBLICA:

Há alguns dias, em evento em Brasília, Vossa Excelência afirmou que “nenhum país do mundo chegou ao desenvolvimento sem romper com as amarras antigas da burocracia. No Brasil, o que aconteceu foi que aumentaram muito as estruturas de fiscalização e encurtaram muito as estruturas de realização do governo”.
Criticando a lentidão do setor público, disse ainda a senhora presidente: “A burocracia distorceu as necessidades do Estado brasileiro por mais de 60 anos. Para avançarmos é necessário tornar o Estado brasileiro um Estado eficiente, transparente e moderno. Um Estado à altura das necessidades que nosso povo tem de obras, de projetos, de programas, de realizações, que simplifiquem a vida do cidadão”.

No setor elétrico, senhora presidente, nós, mais do que ninguém, conhecemos muito bem os entraves que a burocracia é capaz de criar quando temos 640 projetos, com mais de 7.000 MW de novas hidrelétricas de baixo impacto ambiental, equivalentes a 50% de uma nova Itaipu, paralisados na Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) por sete, oito e até dez anos, por exigências ilegais, que contrariam não só o bom senso, mas regras da própria agência.

Sabemos perfeitamente o que são essas “amarras antigas da burocracia” que a senhora com justiça aponta, quando constatamos que regras não isonômicas e tendenciosas, aplicadas nos leilões da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), fizeram com que as termelétricas fósseis açambarcassem nada menos do que 40% das compras de energia, enquanto apenas 1% foi comprado das pequenas hidrelétricas, com reservatórios menores do que 15 campos de futebol, localizadas próximas dos maiores centros de consumo. Mais do que em qualquer área da administração pública, no setor elétrico, senhora presidente, os estragos provocados pela falta de transparência e de isonomia, que são as filhas bastardas da burocracia, são enormes.

Segundo estudos publicados pela consultoria PSR, recentemente, apenas nos dois últimos 22 meses, a burocracia já nos fez torrar mais de R$ 53 bilhões. Por isso, no setor elétrico, o combate à burocracia é urgente e precisa ocorrer de imediato, sem que possamos esperar mais. Muito menos esperar pela posse de um novo governo, em 1º de janeiro de 2015.

Remover os entraves burocráticos do setor elétrico é urgente, como parte do esforço nacional pela ampliação da oferta de geração. Mesmo porque esses entraves só beneficiam alguns poucos, sendo fonte permanente de subjetividade e insegurança regulatória para os processos, de insegurança jurídica para os investimentos e de insegurança econômica local e sistêmica para o fornecimento de energia.

Nossas afirmações, embora possam parecer pesadas, são justificadas pelo relato que a seguir fazemos chegar a Vossa Excelência, para que possa tomar conhecimento de nossos argumentos diretamente, sem intermediários, de forma que, ciente de uma opinião diferente, a dos agentes do setor, possa efetuar mudanças urgentes e necessárias.

Permita-nos, então, iniciar nosso relato lembrando que, no Brasil, as fontes renováveis de energia, como a hidrelétrica, a eólica e a biomassa, alternam sua máxima produção ao longo dos meses do ano, como no gráfico a seguir.
Entre o sul e o norte, quando os ventos diminuem, as chuvas aumentam. Enquando são ambosque começam a diminuir de intensidade, é a safra da cana e da biomassa que estará no seu máximo.

Por isso, se leilões promovidos pela EPE/Aneel/MME, a falta de transparência e de isonomia não atrapalhassem tanto as fontes renováveis, como prova o gráfico acima, teríamos comprado energia de todas elas numa mesma proporção, no caminho de uma matriz quase perfeita, com tarifas naturalmente módicas devido ao mínimo consumo de fontes fósseis, que são caras, poluentes e importadas. As fontes térmicas fósseis apenas são próprias para operar num país como o Brasil, em condições emergenciais ou contingenciais, de forma não permanente.

A FALTA DE TRANSPARÊNCIA E DE ISONOMIA: AS FILHAS BASTARDAS DA BUROCRACIA
Infelizmente, presidente, o equilíbrio, a isonomia e a transparência não têm sido a regra para os leilões promovidos pela EPE. Se somarmos a energia comprada de cada fonte, em todos os leilões, veremos que o equilíbrio e a isonomia no tratamento não existem. A prova está no gráfico abaixo que a Abrapch precisou elaborar e apresentar à Vossa Excelência e à sociedade, já que nem a EPE, nem a Aneel jamais apresentaram de forma fácil de visualizar os resultados dos leilões que promovem há oito anos.

Graças às regras pouco transparentes e não isonômicas fixa- das para esses leilões, os consumidores compraram sem querer e ser consultados, quase 40% de toda a energia das térmicas fósseis. Enquanto apenas 1% dessa energia foi comprada de pequenas hidrelétricas, 13% foi comprada das eólicas e 10% foi comprada da biomassa, números muito pequenos frente ao grande potencial dessas fontes.

Do ponto de vista da burocracia, da eficiência do Estado, coisas que a senhora levanta, seria válido perguntar: por que razão a EPE, que custa aos brasileiros 40 milhões de reais ao ano, nunca se interessou em publicar um gráfico no qual a sociedade pudesse ver claramente tais resultados? Por que nunca divulgou a metodologia e os cálculos que utilizou para determinar preços tão baixos para a energia das PCHs (máximo de R$ 148,00/MWh) e admitir preços tão altos para as térmicas fósseis (de até R$1.160,00/MWh)? Por que a EPE não procurou saber as causas pelas quais as fontes mais baratas, nacionais e menos poluentes, não conseguiam concorrer nos leilões? Por que, por exemplo, a EPE não procurou conhecer as causas pelas quais 640 projetos de pequenas hidrelétricas de baixo impacto ambiental, com 7000MW, estariam esperando, parados nas prateleiras da Aneel e mais 172, nas prateleiras da própria EPE, com mais 2.200 MW? Tudo isso ocorrendo, presidente, enquanto o País era obrigado a queimar R$53 bilhões para escapar de um apagão, soma equivalente aos gastos de duas Copas do Mundo e a duas usinas de Belo Monte? Tudo transformado em fumaça, em despesa de custeio e não em investimento?

Falta de interesse no assunto é apenas a primeira resposta para todas essas perguntas. Devem existir outras. Mas não conseguimos escolher a menos grave e problemática para o Brasil.

QUANDO A BUROCRACIA MANDA, O BOM SENSO DESAPARECE E TUDO FICA TRAVADO.
Todas essas 812 pequenas hidrelétricas PCHs poderiam já estar operando e talvez, integralmente pagas, com essa fortuna que foi gasta pelos efeitos da burocracia, da imposição de preços inexequíveis e da falta de planejamento voltado ao interesse nacional, como relatamos a seguir, para seu conhecimento.

Ao todo, seriam novos 9.200 MW, ou 65% de uma nova Itai- pu, acrescidos a um sistema que tem 87.000 MW hidrelétricos e 128.000 MW no total. Seu licenciamento seria muito fácil, pois seus reservatórios têm, em média, a área de 15 campos de futebol. E elas não estão no meio da Amazônia, mas próximas aos grandes centros consumidores.

Sua construção injetaria R$58 bilhões totalmente privados na economia, gerando 270 mil empregos, com serviços e equipamentos totalmente nacionais. E o que é melhor: elas não usariam petróleo. E nenhum derivado importado. E a água que usariam seria devolvida aos rios ainda mais limpa do que quando entrou nos seus reservatórios.

Explicando melhor a forma pela qual a burocracia se mani- festa no setor elétrico, podemos dizer que desse total de 9.200MW, nada menos do que 2.200 MW já estão outorgados pela Aneel e possuem licenças ambientais, mas então esbarram nos preços claramente inexequíveis fixados pela EPE. Preços tão baixos que nenhum empresário sério pode aceitar, sob pena de ficar inadimplente com o BNDES.

Os outros 7.000 MW, senhora presidente, estão paralisados dentro da Aneel por obra de um “rito”, um procedimento irregular, como tal reconhecido até mesmo pela diretoria colegiada da Agência, pela sua Procuradoria Geral, mas que continua a ser mantido por uma superintendência “rebelde”, que não obedece à diretoria, nem à lei, nem a seus próprios regulamentos.

Esse “rito” irregular é a exigência de licenciamento ambiental prévio, antes do início da análise e da aprovação dos projetos básicos de engenharia. E antes, portanto, do momento fixado no regulamento, que é o da outorga da autorização. Quando há mais de um interessado, a absurda exigência assume contornos inimagináveis, pois a “superintendência rebelde” exige licenciamento ambiental dos dois, ou dos três ou dos quatro interessados! Algo que os órgãos ambientais não admitem, é claro!

É incrível que a burocracia tenha conseguido que ta- manha quantidade de energia renovável continue a ser desperdiçada enquanto torramos derivados de petróleo importado. Não entendemos como a Aneel e a EPE não ajudam o governo federal a destravar o uso desse enorme potencial hidráulico, que legalmente está sob a responsabilidade dos seus diretores, sob contrato de desempenho, para atender os interesses nacionais. Afinal, há várias leis sendo flagrantemente desobedecidas. E ninguém consegue fazer esses mais de 640 projetos serem analisados. Parece de propósito! Basta olhar para os indicadores gerenciais da Aneel quanto à produção dessa “superintendência rebelde” para se indignar com os seus resultados, seja em inventá- rios aprovados, seja em projetos de grandes hidrelétricas, seja em estudos de viabilidade, seja em projetos de PCHs! Não conseguimos entender como é possível que isso aconteça no nosso País em plena crise de oferta de energia. E imaginamos que, se algo parecido ocorresse em outros Programas, como o Luz para Todos, Minha Casa Minha Vida ou Mais Médicos, com certeza, ações enérgicas já teriam sido tomadas. Por que a Aneel e a EPE não simpatizam e atrapalham tanto quanto podem a geração hidrelétrica de pequeno porte e de baixo impacto ambiental? Por que a EPE projeta grandes hidrelétricas apenas na Amazônia e ainda por cima, sem reservatórios, sem que nenhum órgão ambiental possua qualquer norma contra isso? (Por favor, presidente, se alguém lhe disser que isso ocorre porque “a Amazônia é plana”, peça ajuda ao Departamento Geográfico do Exército para desmentir essa conversa).

Seriam perguntas importantes, que a sociedade teria feito há muito tempo, se existisse um sistema nacional que assegurasse a participação da cidadania na vida do País. Um sistema que desse a todos a oportunidade de debater as políticas sociais da energia elétrica em uma Conferência Nacional. E por exemplo, de escolher quando e como usar as fontes renováveis e as fontes fósseis. Ou ainda, se as usinas hidrelétricas devem ou não devem ter reservatórios.

Veja, senhora presidente, que há mais de 70 anos as áreas da saúde, da educação, do meio ambiente, da habitação, do saneamento, já usam as Conferências e os Conselhos Nacionais, como o Conama, para debater suas políticas públicas. E para encontrar soluções, que levaram o Brasil a avançar tanto com a reconstrução do SUS, com o Minha Casa Minha Vida, os Medicamentos Genéricos, o Mais Médicos, o Luz Para To- dos, o Brasil Sorridente, o Brasil Sem Miséria, o Territórios da Cidadania e tantos programas que vêm dando certo porque foram construídos e implementados com o governo federal ouvindo os interessados.

Mas infelizmente, nenhum governo, mesmo democrático, jamais quis abrir a questão energética ao debate amplo com a população. A energia sempre foi tratada como algo muito complexo, quase misterioso, a que somente poucos sábios e iluminados teriam acesso, por ser “difícil”, “estratégico” e até mesmo sob a desculpa de ser ligado à “segurança nacional”. O resultado não podia ser outro. Sempre estamos às voltas com tarifas altas, com risco de apagão, com ONGs estrangeiras mandando na luta contra hidrelétricas, etc. E todos querendo, ao mesmo tempo, mais energia e menos usinas.

É quase certo que se essa participação existisse, as pequenas hidrelétricas, as eólicas do Nordeste, as térmicas à biomassa e a resíduos sólidos urbanos em todo o Brasil mereceriam por parte da EPE, uma melhoria adequada, transparente e isonômica, nos seus preços-teto e nas demais regras dos leilões.

E certamente, a metodologia pela qual a EPE elabora a formação desses preços máximos já teria sido divulgada e não mantida em segredo, como ocorre hoje.
Outro dia, numa reunião do FASE, que é o fórum que reúne todas as associações do setor elétrico, tivemos uma apresentação sobre o que ocorreu no Chile e na Argentina por ocasião das eleições presidenciais, com relação à questão energética. Lá, o debate entre os candidatos mereceu atenção especial sobre a questão da energia, a ponto de ocorrer em um dia fora da programação normal dos debates sobre os demais temas.

Se as conferências de energia fossem uma realidade, certamente algum funcionário da EPE ou da Aneel já teria questionado seus diretores com perguntas assim: “Será que devemos construir grandes hidrelétricas sem reservatório, se essa exigência não existe em nenhuma lei ou normativa de nenhum órgão ambiental estadual ou federal, mas foi criada apenas por nós mesmos?”.

“Será que não seria melhor aumentarmos o preço-teto em 15%, para permitir que mais PCHs participem dos leilões, estimulando a concorrência entre os agentes desse setor, para fazer os preços finais baixarem naturalmente, em níveis que viabilizem a reprodução do capital e os novos investimentos, como nos ensinaram nossos mestres, Adam Smith e David Ricardo?”

“Afinal, se como sabemos, as PCHs produzem mais energia numa época do ano, mas em outras épocas, elas precisam ser completadas pelas eólicas, pelas usinas a biomassa, solares e vice-versa, se estabelecêssemos preços-teto um pouco mais altos, não estimularíamos todo um mercado da complementaridade, fazendo nossa matriz mais limpa e menos dependente do petróleo? Será que ao querer limitar o preço-teto das PCHs muito baixo, nós não estamos favorecendo as termoelétricas, tirando da concorrência uma fonte concorrente?”

“Será que aumentar nossa dependência do petróleo para gerar a energia é bom para a segurança e a soberania nacionais, se a disputa pelo petróleo provoca as tensões e conflitos aos quais assistimos todas as noites na TV?

“Será que, para gerar energia elétrica da qual dependemos para tudo, seria bom dependermos de combustíveis que nos chegam do exterior por via marítima, cujo fornecimento está sujeito a guerras, a ataques a refinarias, gasodutos e oleodutos, a bloqueios e a sabotagens? Para que precisamos correr todo esse risco gastando 53 bilhões em menos de dois anos, se temos tanto potencial renovável já projetado em nosso País, esperando apenas que a EPE fixe preços que sejam exequíveis? Será que temos que copiar os países que não possuem o potencial hidrelétrico que temos? Por quê? Para quê? Apenas para parecermos “modernos”, na “onda termoelétrica” ditada pelas grandes petroleiras internacionais e governos estrangeiros? A essa altura, a senhora presidente que nos seguiu paciente e

interessada até aqui, deve estar ansiosa por fazer uma pergunta: “Afinal, qual é essa diferença de preço-teto?” Ou em outras palavras: “Qual seria o preço-teto que as PCHs precisariam receber para serem viáveis, mas que a EPE não está querendo pagar, apesar de concordar em pagar mais de 1.000 reais por megawatt-hora para as termelétricas, alegando que pagar mais a vocês faria as tarifas subirem?”

Essa seria a primeira pergunta que nos seria feita pela população numa Conferência Nacional de Energia. E nossa resposta seria que os preços-teto viáveis e que como teto, poderia até baixar, no calor de um leilão, estariam entre R$165,00 e R$180,00 por megawatt-hora, conforme a região, devido aos custos das linhas de transmissão e a conformação topográfica dos terrenos.

“E quanto a EPE já concorda em pagar? Qual é a diferença?”. Nossa resposta seria: depois de um ano de muita luta e de existência da Abrapch, a EPE já concordou em elevar o nosso preço-teto dos ínfimos R$112,00 que vigoraram até novembro de 2013, para R$148,00. Assim, estaríamos falando agora de uma diferença relativamente pequena de R$ 17,00 a R$ 32,00 a mais, por megawatt-hora, para atingirmos o limiar da viabilidade das PCHs. Ou seja, estaríamos falando num total, presidente, de ape- nas mais R$700 milhões por ano de gasto com a compra da energia dos 9.200 MW ou 65% de uma nova Itaipu, ao preço das PCHs mais próximas. E de apenas mais R$ 1,35 bilhão ao preço mais distante. Quase nada frente a esses 53 bilhões que a PSR já contabilizou.

E isso, precisamos lembrar, sobre um total de gastos de R$6,9 bilhões de reais/ano no primeiro caso e de 7,6 bilhões de reais/ano no segundo caso, muitíssimo distante dessa fortuna que foi torrada, virou efeito estufa, com as termoelétricas em menos de dois anos.

Para provar, presidente, que esses R$148 oferecidos pela EPE hoje não são suficientes, basta ver que, no último leilão, realizado no dia 6 de junho último, nenhuma PCH conseguiu fazer ofertas e participar, como ocorreu durante os anos de 2010, 2011 e 2012.

Para ter ainda mais certeza de que esse preço é inexequível, basta dizer que esse valor de R$148 é 31% menor do que os R$ 213/MWh que são pagos hoje pela Eletrobras às pequenas hidrelétricas que foram contratadas em 2004, e que a elevação do Custo Unitário Básico da construção civil nesse período foi de mais de 75%.
Outra pergunta que a senhora poderia nos fazer: “Por que vocês acham que as pequenas hidrelétricas seriam importantes, merecendo atenção especial do governo federal, se elas são apenas pequenas usinas? O governo tem que se preocupar com coisas grandes”.

Primeiro, porque as PCHs podem ser pequenas no impacto ambiental, mas são muitas e muito grandes na potência que podem acrescentar. Além dos 9.200 MW já projetados por nós, o Brasil já tem inventariados e identificados mais outros 15.000 MW de PCHs, mais que uma nova Itaipu. Esses potenciais es- tão apenas esperando as condições continuarem a melhorar para serem transformados em novos projetos.

Em segundo lugar, porque as PCHs podem operar em lugar de algumas turbinas das grandes hidrelétricas. Estas, assim, poderão economizar água, tornando possível encher seus reser- vatórios, que hoje não enchem de tão grande que é o consumo. Se na época das chuvas, as PCHs assumissem parte da carga das grandes usinas, estas poderiam guardar água e energia para usar na época das secas, fazendo o Brasil depender menos das térmicas.

Somos pequenos, mas podemos ajudar muito a economizar energia renovável. E isso já é feito hoje, só que com térmicas, queimando derivados de petróleo importado. Nós, das PCHs, podemos fazer a mesma coisa, mas com água.

Pedimos licença aqui para mostrar à senhora presidente, parte de um artigo de nosso colega no Grupo de Energia do Instituto Cidadania, Roberto D’Araújo, de Furnas, intitula- do “Da superfície para as entranhas”, sobre como as PCHs poderiam ajudar muito as grandes usinas a encherem seus reservatórios sem precisar acionar termelétricas caríssimas que estão gerando esses aumentos estúpidos, nunca vistos, nas contas de energia das famílias brasileiras e das empresas.

Ele prova, com dados dos baixíssimos índices de vertimento do sistema, que nossos reservatórios não enchem mais e que portanto as PCHs poderiam estar gerando em lugar de algumas de suas turbinas, para economizar água: “No debate sobre a atual situação, parece que todos se preocupam com o fundo dos reservatórios. Como explicado anteriormente, alguns defendem a construção de novos reservatórios como se uma ou duas novas usinas fossem resolver o defeito estrutural do sistema.

Estranhamente, ninguém parece se preocupar com o outro limite dos reservatórios, o seu topo. Ora, o atingimento da reserva máxima nos parece ser também um indicador de como o sistema está sendo gerido. O gráfico abaixo mostra que, além de estarmos esvaziando os reservatórios, não estamos conseguindo enchê-los.

O dado de vertimento (barra azul, eixo direito) mostra exatamente esse efeito. Como há descargas obrigatórias à jusante, os percentuais mostrados tornam evidente a sistemática impossibilidade de reencher os reservatórios. O ano de 2011 registrou uma energia natural 20% acima da média e, nem assim, registramos vertimentos compatíveis com recuperação completa dos reservatórios. O que isso tem a ver com usinas a fio d’água (sem reservatórios)?

Tudo. Essas usinas, por exemplo, as Pequenas Centrais Hidráulicas, só são inúteis quando o sistema atinge, na maioria das vezes, a reserva máxima. Isso não está ocorrendo há anos. Nessa situação, uma usina a fio d’água funciona como uma nova captação de afluências que poderiam minorar as baixas hidrologias. No caso das PCH’s, há um potencial significativo (cerca de 9 GW) que, além de melhorar esse indicador, ainda alivia a demanda na hora da ponta, pois essas usinas não estão localizadas tão longe dos centros de carga. Que metodologia é essa que não percebe coisas tão óbvias?”

Somos pequenos, médios e grandes empresários, mas somos muitos. E podemos ser muitos mais ainda, se a EPE parar com essa perseguição injustificada ao setor e sentar conosco para conversar, como já pedimos de forma oficial por três vezes e informalmente, por outras três vezes, porém ainda sem resposta. Afinal, se nós queremos investir em geração de energia, com recursos privados, por que a Aneel e a EPE fazem de tudo para impedir que o fazemos?
Nós já investimos um bilhão nesses projetos, dos nossos recursos. Por que será que duas agências do governo querem impedir investimentos privados em geração? Ou será que querem que nossos projetos primeiro mudem de mãos, para somente então, deixarem que sigam normalmente seu curso? Algumas perguntas que faremos são bem fáceis de responder, já estão aí no texto. E nós acreditamos que seria muito melhor respondê-las em reuniões do que em ambientes menos informais e mais tensos, como costumam ser as audiências no Judiciário e no Congresso, aos quais estaremos recorrendo de forma constante, com dados, fatos e números cada vez mais precisos, cada vez mais claros.

Estamos preparados para esperar. Somos pacientes. Ajudamos a criar a Frente Parlamentar das PCHs e da Microgeração, acreditamos na realização da Conferência Nacional de Energia e estamos iniciando um trabalho com as distribuidoras para que elas também promovam seus próprios leilões e a EPE deixe de ser a única compradora no mercado regulado.

Continuaremos o trabalho iniciado há apenas um ano, na Abrapch e no FASE, que ajudamos a formar, até que todos os senadores, deputados e os magistrados federais em Brasília e a sociedade brasileira como um todo possam ter mais informação sobre como funciona a “caixa-preta” do setor elétrico. Com a Aneel, o diálogo já começou e temos confiança de que progredirá no rumo do combate à burocracia, à falta de transparência, de isonomia. Tudo isso, apesar de a “superintendência rebelde” continuar impunemente fazendo suas próprias leis, tratando os agentes com enormes doses de pessoalidade, desobedecendo a decretos, regulamentos e decisões da Diretoria Colegiada do órgão, como se a ordem ali fosse barrar, de qualquer jeito, o uso pelo Brasil do seu enorme potencial hidrelétrico.

Apesar dos seus esforços, presidente Dilma, com esse tipo de atuação impune, nefasta da burocracia, as tarifas aos consumidores finais no Brasil não caíram de forma consistente, mas ao contrário, têm uma tendência de subir 30% neste ano, devido a ações desenvolvidas dentro de seu governo, contra o seu governo.

Os gráficos abaixo mostram o baixíssimo desempenho ope- racional da produção da SGH, órgão da Aneel, encarregado da análise de qualquer tipo de projeto hidrelétrico no Brasil. Nos eixos da direita está a potência (linha marrom) e nos eixos da esquerda (linha preta), estão as quantidades de estudos e projetos aprovados.

Todas as curvas, presidente, além de muito baixas em quantidade, mostram tendência decrescente. E tudo isso acontece exatamente no país campeão mundial em potencial de energias renováveis e o terceiro do mun- do em potencial hidrelétrico. Em seu discurso, a senhora falou da necessidade de combatermos a burocracia inútil. Se existe algum procedimento burocrático no governo federal que esteja atravancando o progresso e mereça ser investigado, nós dizemos que está ali, na SGH.

Afinal, o prejuízo por não termos mais hidrelétricas em ope- ração passou de 53 bilhões de reais. A senhora já tinha ouvido falar da SGH e do seu ritmo lentíssimo de produção? Nesse ritmo, de 30 projetos de PCHs por ano, seriam necessários mais de 20 anos para analisar todos os nossos 640 projetos que estão paralisados na SGH/ANEEL. São aprovados, em média, apenas 300 MW/ano de PCHs para um total de 7.000MW nas prateleiras da agência reguladora.

Nós acreditamos no diálogo. Mas dialogar não é procurar o caminho dos “jeitinhos” e da bajulação inconsequente. Ser cidadão é ser franco e direto. É respeitar o tempo dos cidadãos e cidadãs que, como a senhora, estão encarregados de dirigir o Estado, que não podem perdê-lo com coisas secundárias e sem maior significação. Aplaudir aquilo que está certo ajuda, pois também orienta.

Mas dizer o que está errado tem muito mais valor, por exigir coragem e sinceridade, duas características que às vezes teimamos em não conseguir colocar para fora, na quantidade que gostaríamos. Principalmente não temer represálias e vendetas.

Além disso, presidente, tal como o “Luz para Todos”, que já atendeu 15,1 milhões de pessoas, não era um programa apenas para levar energia a quem não tinha, mas para integrar vários programas de desenvolvimento social, criando mais cidadania, as PCHs não são apenas “fábricas de energia”, como são as termoelétricas fósseis.

Elas podem ser empreendimentos que aproveitam de forma múltipla os recursos hídricos, para irrigação, fruticultura, lazer, turismo, controle da erosão, das enchentes, da qualidade da água, da ocupação e do plantio irregulares, do assoreamento e da disposição ilegal de agrotóxicos, esgotos domiciliares e de esterco de animais.

Para dar ideia de como o aproveitamento múltiplo é importante para toda a população, e é desconsiderado, permita-nos agora, presidente, mostrar como funciona o cassino dos lei- lões de energia e como, se eles considerassem as chamadas “externalidades” das PCHs, poderiam ser muito úteis para desenvolvermos nosso País de ponta a ponta.

QUANDO A DEUSA DA FORTUNA SE APODERA DO PLANEJAMENTO DA EXPANSÃO.

Usando os mesmos mecanismos com que a deusa Fortuna controla os cassinos, a EPE prefere, em vez de planejar que tipo de fonte e em qual quantidade deve comprar para cada época do ano, em cada região, recorrer apenas à sorte e ao acaso previsíveis dos leilões e suas regras pouco lógicas.

Neles, usando fórmulas aparentemente cabalísticas, a que chama de “cálculo do ICB”, a EPE quer nos levar a crer que as caras e poluentes térmicas fósseis é que saem mais barato do que as renováveis, pois conforme seus cálculos, as térmicas operariam apenas um ou dois meses por ano, o que, conforme sabemos agora, não acontece mais, mas sim a contínua operação desse tipo de usina, ao longo dos últimos dois anos, devido ao aumento do consumo e à falta de novas hidrelétricas, em razão do preço inexequível que a própria EPE tem fixado.

A magia começa pela imposição pura e simples, sem nenhuma justificativa técnica conhecida ou revelada, (como manda a lei), de preços-teto tão baixos para as fontes renováveis, que sua construção seria inexequível se ganhassem os leilões, em especial para as PCHs e as térmicas à biomassa.

Para as eólicas, como a EPE sabe que elas não podem guardar energia e produzem muito menos que o normal entre janeiro e julho, até há alguns meses, seus preços eram viáveis desde que a EPE comprasse mais energia térmica para fazê-las funcionar bem o ano todo. Assim, elas receberam grandes estímulos há alguns anos, conseguindo várias isenções tributárias, não considerando o custo das linhas de transmissão, etc.

Mas agora, a EPE já começou a dificultar a vida das eólicas também, aumentando a curva de permanência de geração de 50% para 90% do tempo e tentando retirar o desconto que todas as renováveis abaixo de 30 MW possuem para o transporte de energia.

Sabendo que a garantia física do sistema hídrico está superestimada, e que ele produzirá menos energia hidroelétrica, basta que a EPE subestime a quantidade de meses que as termelétricas deveriam operar e está feita a mágica!

As térmicas ficam “mais baratas” do que as eólicas, as PCHs e as térmicas a biomassa, na hora do leilão. Mas custarão 53 bilhões mais caro para os consumidores, na hora de pagar a conta. E agora os geradores também dividirão essa conta, pela lei 12.783.

A PROFECIA AUTORREALIZÁVEL: “IMPEÇAM AS PEQUENAS HIDRELÉTRICAS DE CONCORRER NOS LEILÕES REBAIXANDO-LHES A TETO DE PREÇO, E AS TÉRMICAS VÃO BOMBAR”!

Quanto à energia das grandes hidrelétricas já existentes, senhora presidente, é muito fácil saber que vai faltar. Afinal, quem elaborou as fórmulas de cálculo da garantia física sabe que elas têm erros para maior e que, no médio prazo, vai faltar energia sempre. E cada vez mais. Afinal, já faz muitos anos que os reservatórios das grandes usinas não conseguem mais encher, devido ao crescimento do consumo e a falta de novos reservatórios. Por melhores que sejam os períodos chuvosos, esses reservatórios não verteram nenhuma água sem turbinar, nos últimos anos. O que prova nossa afirmação.

Quanto à energia das novas grandes hidrelétricas, nossos planejadores também sabem que elas demorarão muito para ficarem prontas, provocando mais falta de energia, pois foram escolhidos “a dedo” os piores e mais longínquos lugares para serem construídas, lá nos confins da Amazônia.

Além disso, pela forma como tratam os indígenas, ribeirinhos e a população da região, nossos planejadores já sabem que essas usinas não conseguem cumprir seus prazos de entrega, devido a complicações no licenciamento ambiental, motivadas pela maneira inábil com que essas atividades são conduzidas, como se o governo não tivesse nada a ver com elas, a não ser na hora de apagar o fogo das revoltas.

Quando as usinas ficarem prontas, afinal, nossos planeja- dores sabem que Belo Monte, Santo Antonio e Jirau não têm reservatórios e por isso não disporão de energia acumulada para atender a demanda durante boa parte do ano.

Quanto às pequenas hidrelétricas de baixo impacto ambiental, cujos projetos já somam 9.200 MW, mais de 65% de uma nova Itaipu, nossos planejadores sabem que elas também não conseguirão entrar em operação, graças aos preços-teto que eles mesmos fixaram, abaixo de 70% dos praticados em 2004, que impedem que participem dos leilões, pois são inexequíveis.

ENQUANTO AS RENOVÁVEIS SE DEGLA- DIAM ENTRE SI, AS TÉRMICAS FÓSSEIS FATURAM ALTO COM A CRISE
Se tudo continuar assim, senhora presidente, a sociedade continuará acreditando que as PCHs apesar de serem um ótimo negócio, foram encantadas por alguma bruxa maligna, como príncipe transformado em sapo, e ficarão fora do jogo, pois não conseguirão se viabilizar nem conseguir financiamentos, já que o BNDES, com preços assim tão baixos, também sabe que elas não conseguirão pagar os seus empréstimos.

Não satisfeitos, presidente, os magos que transformam príncipes em sapos e caras termoelétricas em “baratíssimas vencedoras de leilões”, também gostam de imitar os sanguinários Imperadores romanos.

E colocam para competir entre si, nas arenas dos leilões, como se fossem gladiadores cativos, com regras muito desfavoráveis, as fontes da grande família das renováveis.

Assim, eólicas, pequenas hidrelétricas e térmicas movidas à biomassa ou a resíduos sólidos urbanos (lixo) são coloca- das para fazer a guerra umas às outras, competindo entre si, como se fossem concorrentes e inimigas. E não, companheiras fraternas, que deveriam ser compradas e usadas como complementares entre si, ao longo do ano.

Para dificultar ainda mais a luta para os empresários de menor porte, que geralmente são os investidores das energias renováveis, como acontecia no Coliseu, no meio da luta, é aberta na arena dos mesmos leilões, a portinhola para a entrada das grandes usinas hidrelétricas, dos grandes grupos econômicos, que possuem muitos outros interesses com o governo.

Essas usinas, num mesmo empreendimento, podem vender até 30% da energia gerada para o mercado livre, sem precisar revelar o valor de suas operações. Assim, usam o subsídio cruzado dos preços praticados nos dois mercados para vencer os leilões aparentando ter preços menores, que não incluem também as linhas de transmissão nem levam em conta seus custos ambientais, cada vez maiores.

Mas o grande final, o máximo da falta de isonomia e de transparência ocorre quando, na arena dos leilões, são jogadas também as térmicas movidas a gás, a óleo diesel, a carvão, óleo combustível e outras feras da poluição, dos grupos com grande influência política, mascarados com as máscaras de ferro do silêncio, da ignorância da sociedade e da falta de reguladores interessados em investigar o que está ocorrendo no setor. Seu preço, apesar de ultrapassar os 1.000 reais por megawatt, sofre uma mágica, com o uso da “Formula do ICB”, e passa a pare- cer menor, na hora do julgamento do leilão do que será realmente na hora de pagar. Ou seja, calculam seu “preço do leilão” como se elas fossem funcionar apenas por dois ou três meses ao ano, mas como se subestima o seu tempo de operação ao superestimar a garantia física das grandes usinas, o preço que realmente os consumidores e todos os geradores pagarão será muito maior. Tudo se passa como se apenas uma das fontes renováveis pudesse sobreviver à luta fratricida entre irmãos renováveis. É aplicada a regra do “divide et impera”, que, segundo Maquiavel, consiste em estimular divisões entre os adversários, fomentar a desconfiança e a inimizade entre eles e por fim, criar gastos sem sentido que reduzam sua capacidade de resistência. Nesses leilões entre renováveis, senhora presidente, tudo se passa como se existisse um campeonato, uma Copa do mundo, onde só uma das renováveis pudesse sair vencedora e como se o critério de julgamento do vencedor fosse apenas aquela que pagasse o menor salário aos seus jogadores e não o placar final dos jogos, o saldo de gols, a quantidade de pontos, ou a obediência às regras do jogo. Nenhuma outra externalidade é considerada nesse estranho certame dos leilões de energia promovidos pela EPE/Aneel/MME.

Por mais absurdo que pareça, presidente Dilma, para a EPE, não importa se estando mais próximas dos centros de carga, as PCHs acarretam em menores perdas de energia, exigem menos investimento em transmissão, podem atender as necessidades do horário de ponta, e graças às linhas mais curtas, melhorem o desempenho do sistema como um todo.

Não interessa para EPE se a presença das PCH’s conectadas ao sistema aumenta muito a sua confiabilidade e segurança, oferecendo mais uma alternativa não apenas de suprimento, mas de geração.

Não importa, aos nossos “Imperadores da Energia”, que não ouvem ninguém, há oito anos, se o uso múltiplo dos recursos hídricos que proporcionam as PCHs acarretaria em novos investimentos em irrigação, piscicultura, aquicultura, contenção de cheias, combate às secas, turismo, lazer, educação ambiental e controle da qualidade da água.

Não importa se a cadeia produtiva das PCHs é toda nacional, e esteja sendo hoje destruída, após anos e anos de trabalho e de investimento dos empresários, hoje obrigados a vender serviços para sobreviver sem demitir todo seu pessoal alta- mente especializado.

Não importa se as PCHs sejam as únicas renováveis que são obrigadas a constituir e preservar às suas custas, significativas áreas para a preservação ambiental permanente, em torno dos seus reservatórios.

Não importa se muitas vezes, essas áreas sejam até maiores, em extensão, do que os reservatórios que protegem. E não importa, finalmente, que recompondo essas áreas com espécies nativas de fauna e flora, os empreendimentos de PCHs evitem e corrijam várias formas de agressão ambiental como a ocupação irregular e perigosa das margens com habitações inseguras, o plantio irregular, a disposição de esgotos, de resíduos tóxicos, os incêndios florestais e, principalmente, a erosão do solo e o assoreamento.

O VALE-TUDO CONTRA O APAGÃO.

Tudo se passa, presidente Dilma, como se a burocracia da área energética não fizesse parte do mesmo governo que os ministérios do meio ambiente, da agricultura, do desenvolvi- mento industrial, do trabalho e emprego, da pesca e aquicultura, da saúde e principalmente, da fazenda e do planejamento.

Tudo se passa como se, para evitar o “apagão”, tudo pudesse ser feito e qualquer truque de mágica pudesse ser praticado. Quando se junta os fatos, senhora presidente, percebe-se que a tática de criar obstáculos para as energias renováveis e forçar o Brasil ao uso “full time” de todas as suas termo- elétricas a petróleo pode não ter sido apenas coincidência. Nem fruto do acaso de chuvas desfavoráveis, mas sim, uma opção preferencial consciente, proposital e planejada por usar e incentivar as fontes fósseis, movidas por combustíveis e pretendidos pela Copel, Celpe e tantas outras, já estariam nos planos da EPE, antes mesmo de a presidente Dilma fazer reduzir as tarifas no ano retrasado? Ou a EPE não teria sido capaz de prever o que iria acontecer?

Afinal, não seria a primeira vez. Naquela época, de forma claramente intencional, o governo federal parou de investir em novas hidrelétricas, alegando acreditar que terceiros in- vestiriam em geração, apenas por uma confiança ideológica nas forças do mercado. E deu no que deu.

Hoje, de forma quase análoga, o setor elétrico do governo federal parece querer evitar, de toda forma, que os empresários titulares de projetos de hidrelétricas de pequeno porte aprovados pela Aneel, prontos para concorrer e de baixo impacto ambiental, possam construí-las. Por qual razão?

Quem estaria lucrando com essa proibição tácita? Haverá alguém fazendo dificultar as coisas por alguma razão para que a titularidade desses projetos mude de mãos? E quem perderia se essas dificuldades artificiais deixassem de existir?

SE O APAGÃO FOI AFASTADO, POR QUE AGORA NÃO USAMOS AS RENOVÁVEIS PARA VALER?

Teria a EPE adotado essa solução de proteger as térmicas e prejudicar as PCHs, por algum tipo de “excesso de zelo” ao procurar cumprir, a “qualquer custo”, uma ordem superior para evitar um apagão, “de qualquer jeito”, nem que isso significasse gastar 53 bilhões de reais até agora?

Ou terá existido desconfiança do seu governo, senhora presidente, na capacidade de as centenas de empreendedores de energias renováveis construírem seus empreendimentos a tempo de evitar o apagão, se existem tantos obstáculos ambientais para serem ultrapassados?

Ou terá sido apenas medo, ou preferência pelo que é certo ao duvidoso? Terá existido apenas a preferência pela velha e conhecida geração alimentada pelo petróleo, para evitar qualquer risco de racionamento e com ele, de qualquer retrocesso da economia? Não podemos saber, mas como as instituições democráticas estão em pleno funcionamento no Brasil, serão elas que dirão o que terá acontecido, após investigações cuidadosas.

Não seria a primeira vez que, por exemplo, o Tribunal de Contas da União encontraria erros nas contas do setor elétrico brasileiro como encontrou nas contas da Aneel no caso dos 8 bilhões da energia emergencial, que até hoje, graças a uma decisão da agência, ainda não foram devolvidos aos consumidores. O fato, presidente, é forçoso que reconheçamos, a Copa foi um sucesso e não tivemos o apagão nem mesmo sob piores secas dos últimos oitenta anos. Isso prova que temos já toda a capacidade instalada de energia térmica de que podemos pre- cisar. Agora então, precisamos buscar a modicidade tarifária. A EPE e a Aneel poderiam agora “baixar a guarda” e deixar de fazer de tudo para impedir as PCHs de participar dos lei- lões. Elas poderiam aumentar esses 32 reais no preço-teto das PCHs sem medo de causar “prejuízo à modicidade tarifária”. Afinal, o que tinha de causar de prejuízo aos consumidores, a própria EPE e a Aneel já causaram.

Ao contrário, agora é a hora, senhora presidente, de aproveitarmos mais esses 9.200 MW das novas PCHs, mais os outros novos 13.000 MW que estão inventariados ou identificados para ajudarmos a EPE a reduzir o peso das térmicas no “mix” do mercado brasileiro. Sem falarmos em mais de 5.000 MW de minicentrais com menos de 1 MW, que ainda não foram aproveitados.

Já trouxemos o preço dos R$ 112,00 para os R$ 148,00/ MWh e o mundo não caiu. Mais 32 reais não prejudicarão os consumidores, ao contrário. Nossos argumentos são sólidos. Mais cedo ou mais tarde, a sociedade tomará conhecimento deles. Nossos 98 associados são empresas com muita tradição. Nossos encontros em Curitiba, Florianópolis, Belo Horizonte e Brasília reuniram mais de 700 empresários.

Nós do setor das pequenas hidrelétricas de baixo impacto ambiental, com os 9,2 GW que queremos construir para ajudar o Brasil a crescer, não temos dúvida de que mais dia menos dia, também conseguiremos ser ouvidos diretamente pela senhora. Parabéns pelo seu discurso contra a burocracia e a favor do aumento da eficiência do Estado Brasileiro. E pode contar com nosso apoio na hora que desejar colocá-lo em prática.

Ivo Pugnaloni é presidente da Abrapch, Associação Brasileira de Fomento às Pequenas Centrais Hidroelétricas e do Grupo Enercons/Enerbios. Foi diretor presidente da Copel Distribuição e diretor de Planejamento da Copel holding, Secretario Adjunto de Transportes da Prefeitura de Curitiba e consultor voluntário do Instituto Cidadania, na elaboração do Programa de Governo para o setor elétrico brasileiro do primeiro mandato do presidente Luís Inácio Lula da Silva.

Nenhum comentário:

Laranjeiras do Sul

Laranjeiras do Sul
Laranjeiras do Sul