quinta-feira, janeiro 08, 2015

Uma crise anunciada

Com a perspectiva de o país voltar a crescer em algum momento, há três fantasmas rondando por aí, com potencial para dificultar os esforços de recuperação econômica
Em agosto de 2007, editorial publicado neste espaço sob o título “O crescimento ameaçado” chamava a atenção para problemas da economia brasileira, a começar pelo alerta de alguns economistas, que viam uma grave ameaça ao crescimento econômico pela possibilidade de um apagão no setor elétrico. Na época já se sabia que, mesmo sem crise energética, o país não conseguiria suportar crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) na faixa dos 5% ao ano em razão de outros gargalos estruturais. O adiamento dos problemas na área de energia veio do elevado volume de chuvas (que repôs os reservatórios e livrou o governo Lula de ter seu apagão) e da crise mundial de 2008 (que impôs limites ao crescimento da produção).

O diagnóstico da crise no setor elétrico apontava para a conhecida falta de investimentos do governo no setor e a necessidade de atrair capitais privados nacionais e estrangeiros para obras nessa área. Porém, o êxito estava condicionado ao abandono do vício ideológico anticapitalista do governo e à conclusão da legislação reguladora das concessões na infraestrutura, sem o que nenhum empresário arriscaria seu capital no negócio. Os governos do PT nunca resolveram sua crise existencial em relação à participação de capitais privados em obras de infraestrutura, seja em parceria com o setor público, seja em projetos autônomos.

O apagão elétrico somente não ocorreu pelo baixo crescimento do PIB nos quatro anos do governo Dilma. Entretanto, com a perspectiva de o país voltar a crescer em algum momento, há três fantasmas rondando por aí, com potencial para dificultar os esforços de recuperação econômica. O primeiro vem das chuvas, que continuam insuficientes e obrigam o governo a colocar em marcha as usinas termelétricas, cujo custo de operação é muito maior que o das hidrelétricas. A escassez de chuvas é tão séria que atingiu seriamente outro setor crucial para a vida nacional: o abastecimento de água.

Ocorre que apagão de energia, ainda que sério e grave, não tem o mesmo potencial de tragédia de eventual apagão de água. Em ambos os setores a escassez de chuvas tem efeitos dramáticos e, em ambos, o desencontro entre os estados e a União está se revelando gravíssimo. Infelizmente, o Brasil tem políticos demais (que só pensam na próxima eleição), quando a crise exige a presença de estadistas (que pensam na próxima geração) capazes de superar as querelas partidárias e encaminhar soluções conjuntas.

O segundo fantasma é a destruição financeira do setor elétrico e foi criado pela teimosia da presidente Dilma Rousseff. Tendo sido ministra de Minas e Energia, ela se considera conhecedora do setor e, como presidente da República, comandou pessoalmente – e de forma desastrosa – a política de investimentos e de reajustes dos preços de energia. O reflexo está nos elevados prejuízos das empresas do setor, nas dívidas e na falta de dinheiro para tocar obras. Na tentativa de segurar a inflação, a fim de que a taxa anual não passasse do teto de 6,5%, a presidente quase destrói o sistema elétrico brasileiro.

A conta começou a chegar em 2014 e prossegue em 2015, que já começa com reajustes da fatura de energia em torno de 8%. O represamento das tarifas foi um desastre, como sempre acontece com todos os congelamentos de preços por decreto a fim de combater a inflação. Mas o governo foi mais longe e fabricou o terceiro fantasma: o dos baixos investimentos estatais no setor. Mesmo retirando em torno de 37% da renda nacional em forma de impostos efetivamente arrecadados, o setor público brasileiro (municípios, estados e União) investe menos de 2,5% dessa mesma renda, aí incluídos todos os investimentos estatais. O que sobra para investimentos em energia é muito pouco em relação às necessidades, razão por que não faz o menor sentido dificultar a participação de capitais privados no setor.


Esse quadro problemático foi agravado por Dilma Rousseff em seus quatro anos de mandato e, a julgar por seu pronunciamento de posse no dia 1.º de janeiro passado, a presidente passa a impressão de não reconhecer o tamanho dos problemas. Quem sabe a gravidade da situação se imponha e o governo opte por rever sua postura e tomar as decisões adequadas às soluções necessárias.


Editorial, Gazeta do Povo

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